A cerca de duas semanas recebi um e-mail do Gilmar Espindola (espindolagilmar@hotmail.com) da cidade de Viamão, pedindo para que se publicasse aqui no Blog Gildo de Freitas esse poema em homenagem ao Gildo de Freitas e aos trovadores. Portanto está atendido o pedido e lembrando que o Gilmar Espindola está dedicando esse poema à dona Carminha Freitas, viúva do seu Gildo de Freitas. Trova de Baitas
Vou lhes contar um caso Que comigo aconteceu: Já era de tardezinha E logo anoiteceu; Procurei abrigo Embaixo de uma figueira, Para da noite me proteger. Como eu iria saber Do que ia se passar? E tranqüilo, com meus pensamentos, Já que estava, ali, sozinho; E a noite corria alta, Me aparece um negrinho Com uma cara de peralta, Esquisito, de uma perna só, E fumando um cachimbo estranho. Logo foi me avisando Que no lugar onde eu estava A noite nunca parava, Era mais movimentado Do que estação de trem. E que ali ninguém, Que vivo estivesse, Parava um só instante, Pois. então. daí por diante, Lhes conto agora o que ouve. Depois, que o negro foi embora.
Não dei muita bola, Pois ninguém me enrola. Achei que era sacanagem E acendi o meu paieiro. Foi quando percebi Um vulto em minha direção, Tinha uma gaita num braço E no outro um violão. Sentou-se, ali, do meu ladinho, Foi pegando o meu fumo E fazendo um enroladinho. E depois de uma bela tragada, Soltando uma baforada, Sem sequer me olhar me informou Que ali onde estávamos Há muito fora marcada Uma destas derradeiras trovas; E eu prova viva seria De toda aquela cantoria.
Bueno! que lugar pra se cantar, Meio deserto, pensei. Decerto outra brincadeira. Nisto, lá adiante, na porteira Começou a chegar gente; Vinham de todos os lados, A se assentar em nossa frente. Logo percebi um detalhe, Que me deixou todo cabreiro, Seus andares pareciam de mancos, E todos vestidos de branco. E pra não sair em disparada, Imaginei que fosse combinada A indumentária usada Para aquela reunião. Aí prestei mais atenção Em outro detalhe muito esquisito: Seus rostos não tinham feições, E mesmo assim eram muito bonitos.
De repente ouvi um grito, Que parecia que vinha lá do infinito. Era o primeiro trovador chegando; Pegou o violão e logo foi afinando. E o outro chegou, no mesmo instante, Todo radiante, aquele baita; E se grudou na tal da gaita E dedilhou uma sinfonia. Que bonita melodia E que qüera original! E o outro bagual, O tal do violão, Me solta um mi maior de gavetão, Que fiquei impressionado. Que presente abençoado Aquela bela ocasião!
Aí se aprontaram Com seus instrumentos, Um de cada lado. Quando o da viola tocou, O seu peito entoou O seguinte verso, improvisado: “Esta trova eu esperei Calmamente, meu guri. Por isso estou aqui, Para ver do que és feito. Mas sei que tu, sujeito, Não vai dar nem pra saída. E quero ver a tua ida Mas cedo do que tu pensas. E nem a recompensa Terás daqui para a frente, E vê se vais logo embora, Ó criatura impertinente”!
O da gaita nem se incomodou E começou seu repertório: “Criatura impertinente És tu, ô rato pequenino. Trova é coisa de gente grande, Mas antes que tu ande Eu vou te dar um bom conselho: Por causa do teu tamanho, Que é de um fedelho, És metido a cantador, Passou a vida mentindo E no rádio sempre grunindo, Enrolando o expectador, Volte pro teu lado do céu, É o melhor que tu me faz; Aqui eu é que sou o ás E síndico deste bordel”!
Bah! pelo início da trova Eu fiquei estarrecido. Eu já tinha conhecido Dois bacanas igual a eles: Um era o do coração de luto E o outro aquele dos passarinhos, E em todos os meus caminhos Sempre escutei eles com atenção; Pra mim sempre foram campeões, Os dois tinham o mesmo brilho, Mas cada um tinha o seu estilo Marcado por seus voseirões.
E aí, meus amigos, Seguiram trovando Por toda a madrugada. Pareciam dois espadachins, Num duelo de vida e morte. E para a minha sorte, Eu fui testemunha deste fato; E lá, no meio do mato, Quem diria, eu testemunharia Este imenso espetáculo.
Mas como já estava amanhecendo, Resolveram terminar outra noite. E antes que o sol os açoite, Se abraçaram sorridentes. E junto com os outros presentes, Se foram não sei para onde, Só sei que pegaram um bonde. E a impressão que me deu, Pois já estava meio dormindo, É que o bonde ia subindo, Em direção ao céu estrelado. Meio complicada aquela saída; Resolvi dar uma dormida E me virei pro outro lado.
Depois que acordei, Parecia até que eu tinha sonhado. Foi quando eu achei um papel, Com tudo da trova anotad0. E nele tinha um recado Me pedindo pra divulgar A trova daquele lugar, Meio estranha, por sinal. Mas, depois, quando eu tiver tempo, Ou a qualquer momento, Escrevo para vocês Este meio final, Porque ficaram de voltar Para a trova terminar, Os dois fulanos de tal.
E, agora, por onde eu ande Sempre escolho uma figueira, Para poder me abrigar. E ainda espero eles voltar, Mas vai depender da sorte; E nas noites de céu estrelado Eu fico cuidando pro norte, Pois foi o rumo que tomaram Depois daquela apresentação. Tenho certeza que voltarão E isto me anima a mente. E quando noto uma estrela cadente Me salta o coração, Pois aquelas duas feras vieram Neste tipo de condução!
Hoje publico aqui a música em homenagem a Gildo de Freitas composta e interpretada por Adair de Freitas, que apesar do sobrenome não têm parentesco próximo com o Gildo.
Compositor: Gildo de Freitas
Álbum: Gildo de Freitas – Zezinho & Julieta
Ano: 1971
Sombra de Cestia
Figueira sombra da cestia
Com certeza estais lembrar
Quando eu com minha amada
Nois passava as tardes inteiras
Ela ria de faceira
Trocamos beijos e carinhos
Que nem casal de pombinhos
Na tua sombra figueira
Me lembro da tua sombra
Eu tive momentos felizes
Mas hoje o destino quis
Que eu pegasse outro caminho
Te lembra quantos carinhos
Ela fazia pra mim
Tudo aquilo teve um fim
Por isso eu voltei sozinho
Por incrível que pareça
Minha querida figueira
Me roubaram a companheira
Eu nem sei que fim levou
Te conto o que se passou
Não é que eu seja covarde
Quero chorar esta tarde
Nesta sombra que restou
Não me censures figueira
Pela loucura que faço
Eu venho neste cansaço
Não posso ser mais feliz
Os teus galhos são Juiz
Deste meu grande fracasso
Por eu não ter nos meus braços
A mulher que eu tato quis
Figueira eu junto de ti
De tudo eu serei capaz
Não quero ver nunca mais
Essa falsa criatura
Para cumprir minhas juras
Eu trouxe esta cavadeira
Na tua sombra figueira
Quero a minha sepultura
Para conhecer mais letras e saber informações sobre as músicas do Gildo de Freitas acessem:
Atendendo a solicitação do Carlos Alberto Fiorenza.
Compositor: Gildo de Freitas
Álbum: Gildo de Freitas-Participação Especial dos Taytas
Ano: 1976
Cantando pra Lua
Ai vai surgindo à lua Cheia como é linda
Com os seus raios luminosos cor de prata
Eu me recordo quando a lua vem surgindo
Das noites lindas que eu fazia serenata
Oh Lua Cheia o teu luar não envelhece
E reconhece que pra ti eu já cantei tanto
Porque deixaste eu ficar assim velhinho
Hoje caio do meu pingo quero cantar e não canto
Quando eu enxergo o clarão da lua cheia
Me dá vontade de andar pelas estradas
Ansiosamente meu coração balanceia
Oh Lua Cheia cadê minhas namoradas
Eu hoje em dia não canto mais serenata
Porque a velhice matou a minha mocidade
Eu vejo a lua luminosa cor de prata
E pouco a pouco vou morrendo de saudade
-É brabo mas a saudade malvada mata a gente!
Quando eu morrer peço aos meus companheiros
Me largue no terreiro e alguém cantando na rua
No meu caixão me ponham um violão junto
Pode ser que meu defunto ainda cante para a Lua
Na minha campa dia santo e de finado
Quero cantiga quero sorrisos e palmas
O capelão que reze um terço cantado
Será só isso que alegra a minha alma
-Vamô fecha as porteiras rapaziada
Talvez a música que o Gildo de Freitas tenha feito para responder Baile de Mais Respeito e Cobra Cascavel tenha sido “Não mexa com quem está quieto” do Lp “Gildo de Freitas E Sua Caravana” de 1968. Nessa música Gildo de Freitas canta em tom de desafio a Teixeirinha e sem modéstia nenhuma afirma que ninguém é capaz de vencer ele na rima demonstrando de que ele tinha consciência de que era o mais talentoso trovador de seu tempo fazendo jus ao seu titulo de Rei dos Trovadores.
Diz também que é melhor para Teixeirinha ter questões contra a lei do que ter questões contra Gildo de Freitas e manda ele se lembrar das provas que ele deu em suas brigas. Essa música pode ser considerada a resposta do Gildo a música do Teixeirinha “A cobra Cascavel” pois é a música que vem em seguida a ela. Por fim para resumir diz que Gildo Freitas não é bom inimigo.
Fiquem com a letra:
Não mexa com quem está quieto
Eu tenho dó de algum contrario
Que com essa idéia pensa
Que apareça quem me vença
Morre de velho e não vê
Deus me consentiu nascer
Vim no mundo para exemplo
Não morro antes do tempo
E não corro sem vê do que
Eu peço perdão ao povo
Sei pra quem estou propondo
Eu Sou um gaúcho redondo
Eu não foi feito quadrado
Eu rolo pra qualquer lado
Quando o perigo vem vindo
Eu conheço o cego dormindo
E também o rengo sentado
Um contrario me vencer
É o mais custoso que eu acho
Só se o céu descer pra baixo
E a terra subir pra cima
Os astros mudar de clima
Trocar verão por inverno
Mudar o céu pra o inferno
Depois eu perco na Rima
É mais fácil burro voar
O galo ciscar pra frente
As galinhas criar dentes
As vacas botarem ovo
Já pedi perdão ao povo
Mas é preciso eu dizer
Contrario pra me vencer
Só que ele nasça de novo
Eu te aviso Teixeirinha
Ligeiro com pouco prazo
Não convém tu criar caso
Que é pra evitar o perigo
Eu não sou bom inimigo
Já sabe as provas que eu dei
Antes pelear contra a lei
Do que ter questões comigo
-Vai abrindo o olho xiru.
Não mexam como o Teixeira!
A resposta do Teixeirinha não tardou e foi em alto estilo na música “Foi Tu que Mexeu Comigo” de 1968 do Lp Ultima Tropeada.
Teixeirinha na letra se defende dizendo que nunca provocou ninguém e também ataca insinuando que Gildo de Freitas quer fazer sucesso na carona do cartaz de Teixeirinha.
Mas o que mais me chamou a atenção nessa letra foi o trecho onde Teixeirinha diz:
“tu já no primeiro disco pensaste que eu era arisco tentou me jogar no cisco e a resposta recebeu “
O primeiro disco do Gildo de Freitas foi “Gildo de Freitas – O Trovador dos Pampas” de 1964 e não há nenhuma música provocando Teixeirinha que possa ser percebido claramente, entretanto o Teixeirinha em Baile de Mais Respeito usou como pano de fundo o Baile no Chico Torto para provocar o Gildo o que me leva a interpretar que Baile no Chico Torto possa ter sido de alguma forma uma música que provocou Teixeirinha, até porque o Chico Torto é um local verídico em São Borja e não seria demasiado pensar que Gildo e Teixeirinha tenham se apresentado e ter acontecido algum episodio de amarga lembrança para o Teixeirinha já que ele afirma que o Rei dos Trovadores teria tentando provocar e a resposta recebeu.
Música que conta com a participação da Mary Terezinha no coro.
Mas agora vamos a letra da música.
Foi tu que mexeu comigo
Coro:
//: “Tem desafio vamos prá lá minha amiguinha”.
“vamos rir do Gildo Freitas nas unhas do Teixeirinha” ://
Gildo Freitas abre os ouvidos
Escute minha resposta
Não sei se gosta ou não gosta
Se não gostar tanto faz
Tua letra escutei bem
Alguma inverdade tem
Nunca provoquei ninguém
Isso é calúnia rapaz
Me chama de teu contrário
Tu pensas que eu sou otário
Não vem bancar o vigário
Na aba do meu cartaz
//: “Tem desafio vamos prá lá minha amiguinha”.
“vamos rir do Gildo Freitas nas unhas do Teixeirinha” ://
Gildo eu conheço o teu jogo
Queres cortar meu caminho
Eu sempre vivi sozinho
Com aquilo que deus me deu
Tu diz ser o pai da rima
Também entendo da esgrima
Não queira alcançar lá em cima
Aquilo que não é teu
Tu já no primeiro disco
Pensaste que eu era arisco
Tentou me jogar no cisco
E a resposta recebeu
//: “Tem desafio vamos prá lá minha amiguinha”.
“vamos rir do Gildo Freitas nas unhas do Teixeirinha” ://
Eu te respondo de novo
Lá vai o que tu procuras
Petiço da perna dura
Eu boto ferro no casco
Arranco o tigre da toca
Jibóia vira em minhoca
Como pirão por paçoca
Amanso qualquer carrasco
Troco baixada por serra
Faço o sol descer na terra
Trovador macho não berra
E acabo com teu fiasco
//: “Tem desafio vamos prá lá minha amiguinha
“vamos rir do Gildo Freitas nas unhas do Teixeirinha” ://
Vou te ensinar Gildo Freitas
A respeitar um Teixeira
Meus fãs não são brincadeira
Prá ouvir tua ladainha
Quem me desafia é louco
Deve ter água no poço
Te faço sentar no toco
Comer cobra por galinha
Quer desafio faça a festa
Marque o dia e o que me resta
É marcar na tua testa
O nome do Teixeirinha
Para ilustrar este artigo fiz novamente uma montagem com as duas músicas para que de alguma forma imaginarmos o que seria a trova a distância que muitos historiadores afirmam ter sido a relação de Gildo de Freitas e Teixeirinha através dos discos.
Gildo foi muito incisivo e agressivo em sua música e Teixeirinha foi mais ameno e tentou até fazer uma música mais cômica. Desta vez a briga foi parelha, não ouve vantagem para ninguém. Até aquela altura a relação pessoal e profissional era amistosa, tudo sempre levado na brincadeira mas já se tornava cada vez mais freqüente as fofocas em relação ao que um pensava do outro.
O próximo capitulo será com as músicas Milonga da Fronteira e Resposta da Milonga na quinta parte do Gildo Vs. Teixeirinha.
Semana passada através da comunidade do José Mendes no Orkut descobri a existência de um blog em homenagem ao José Mendes.
No ano passado escrevi um artigo sobreJosé Mendes aqui nesse Blog Gildo de Freitas mas sempre tive a expectativa que alguém criasse um Blog ou site em sua homenagem. Pois o João Filme de Cinema que há anos têm trabalhando na preservação de áudios e vídeos, criou o
Blog CANTORJOSÉMENDES .
Mais uma opção na Web para aqueles que buscam na Internet informações sobre os grandes nomes da música do Rio Grande do Sul de todos os tempos.
E como não poderia ser diferente o Blog Gildo de Freitas recebe com grande satisfação mais este parceiro e ainda fica na esperança que surjam mais gaúchos e gaúchas apaixonados(as) pela música do Rio Grande do Sul e com muita disposição e informação para criar e manter Blogs e Sites sobre a historia da música gaúcha.